Fantasia Lusitana
Raramente um título terá sido tão ajustado a um filme. E "Fantasia Lusitana" passa a ser ponto de paragem obrigatório para olhar para Portugal.
Não era necessariamente aqui que esperávamos encontrar João Canijo, depois das explorações impiedosas do Portugal contemporâneo que foram "Noite Escura" ou "Mal Nascida" - aqui, entenda-se, num filme que está do lado do documentário, mais até do ensaio, do que da ficção.
Mas ainda bem que o encontramos aqui, porque "Fantasia Lusitana", abertura oficial inteiramente merecida do IndieLisboa, faz corpo com o olhar sobre Portugal dos seus filmes anteriores, mostrando como o Portugal de hoje decorre do Portugal de ontem - ou como o Portugal de ontem continua no Portugal de hoje.ípsilon 9-Jan 2011
Construído a partir de imagens de arquivo e de jornais de actualidades, o filme começa por nos fazer mergulhar no Portugal dos anos de 1940, a partir perspectiva oficial da propaganda do Estado Novo.
"Tudo pela Nação", proclamam os slogans de um regime que anunciava o seu orgulho numa pátria com oito séculos de história. Salazar e Carmona discursam e assistem à marcha da Mocidade Portuguesa. Há também fado, folclore e religião.
O desfile pelos artifícios do Estado Novo não poderia deixar de passar ainda pela Exposição do Mundo Português e da apresentação "dos indígenas vindos dos quatro cantos do império".
Um paraíso de paz e harmonia
Portugal é pintado como um paraíso de paz e harmonia, numa altura em que boa parte da Europa agonizava com a II Guerra Mundial e se tornava ponto de passagem ou de refúgio para milhares de pessoas, entre os quais escritores célebres como Alfred Döblin, Antoine de Saint-Exupéry ou a actriz Erika Mann, filha de Thomas Mann.
Os depoimentos, em que relatam as suas impressões do contacto com o país, são lidos pelos actores Hanna Schygulla, Rudiger Vogler e Christian Patey.
As circunstâncias levavam a que um país, atrasado e fechado sobre si próprio, se tornasse inesperadamente cosmopolita, tomando contacto com culturas muito distantes da sua.
É justamente esse contacto que João Canijo utiliza, para fazer um contraponto em relação à imagem oficial do Estado Novo.
O país onde toda a gente cospe
Para os milhares de europeus que aqui passaram, Portugal, com a neutralidade estratégica de Salazar, surgia como um estranho e irreal destino, fora de tudo. Da guerra, mas também da normalidade que conheciam.
A perspectiva de encantamento de quem aqui conseguia escapar ao conflito, resvala amiúde para o choque em relação a um país que chega a ser encarado como dentro de uma excentricidade primitiva. O país do ruído e onde toda a gente, homens e mulheres, cospe no chão, foi a impressão dominante para o alemão Alfred Döblin.
João Canijo, o realizador de "Ganhar a Vida", "Noite Escura" e "Mal Nascida", filmes ficcionais centrados em realidades sujas e mesquinhas, faz em "Fantasia Lusitana" uma incursão no cinema documental, que nos leva até aos registos históricos do Estado Novo.Alexandre Costa (www.expresso.pt
Não era necessariamente aqui que esperávamos encontrar João Canijo, depois das explorações impiedosas do Portugal contemporâneo que foram "Noite Escura" ou "Mal Nascida" - aqui, entenda-se, num filme que está do lado do documentário, mais até do ensaio, do que da ficção.
Mas ainda bem que o encontramos aqui, porque "Fantasia Lusitana", abertura oficial inteiramente merecida do IndieLisboa, faz corpo com o olhar sobre Portugal dos seus filmes anteriores, mostrando como o Portugal de hoje decorre do Portugal de ontem - ou como o Portugal de ontem continua no Portugal de hoje.ípsilon 9-Jan 2011
Construído a partir de imagens de arquivo e de jornais de actualidades, o filme começa por nos fazer mergulhar no Portugal dos anos de 1940, a partir perspectiva oficial da propaganda do Estado Novo.
"Tudo pela Nação", proclamam os slogans de um regime que anunciava o seu orgulho numa pátria com oito séculos de história. Salazar e Carmona discursam e assistem à marcha da Mocidade Portuguesa. Há também fado, folclore e religião.
O desfile pelos artifícios do Estado Novo não poderia deixar de passar ainda pela Exposição do Mundo Português e da apresentação "dos indígenas vindos dos quatro cantos do império".
Um paraíso de paz e harmonia
Portugal é pintado como um paraíso de paz e harmonia, numa altura em que boa parte da Europa agonizava com a II Guerra Mundial e se tornava ponto de passagem ou de refúgio para milhares de pessoas, entre os quais escritores célebres como Alfred Döblin, Antoine de Saint-Exupéry ou a actriz Erika Mann, filha de Thomas Mann.
Os depoimentos, em que relatam as suas impressões do contacto com o país, são lidos pelos actores Hanna Schygulla, Rudiger Vogler e Christian Patey.
As circunstâncias levavam a que um país, atrasado e fechado sobre si próprio, se tornasse inesperadamente cosmopolita, tomando contacto com culturas muito distantes da sua.
É justamente esse contacto que João Canijo utiliza, para fazer um contraponto em relação à imagem oficial do Estado Novo.
O país onde toda a gente cospe
Para os milhares de europeus que aqui passaram, Portugal, com a neutralidade estratégica de Salazar, surgia como um estranho e irreal destino, fora de tudo. Da guerra, mas também da normalidade que conheciam.
A perspectiva de encantamento de quem aqui conseguia escapar ao conflito, resvala amiúde para o choque em relação a um país que chega a ser encarado como dentro de uma excentricidade primitiva. O país do ruído e onde toda a gente, homens e mulheres, cospe no chão, foi a impressão dominante para o alemão Alfred Döblin.
João Canijo, o realizador de "Ganhar a Vida", "Noite Escura" e "Mal Nascida", filmes ficcionais centrados em realidades sujas e mesquinhas, faz em "Fantasia Lusitana" uma incursão no cinema documental, que nos leva até aos registos históricos do Estado Novo.Alexandre Costa (www.expresso.pt
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